LIMITES

Limites não são medidas punitivas, mas sim medidas protetivas.

Você não diz um “NÃO” para uma criança porque não quer que ela explore, ou não quer dar o que ela quer naquele momento ou para punir ela. Você diz um “NÃO” quando há necessidade para proteger ela. Mas, proteger do quê?

Proteger de algum perigo externo, proteger dela mesma (do egoísmo, do individualismo, do egocentrismo), proteger do modo imperativo e imediato “eu quero agora!”.

A criança que recebe limites tende a ser mais educada, mais compreensiva com as coisas do cotidiano e situações da vida. Ela tende a se tornar um ser humano melhor para com ela e para com os outros.

Como seres humanos somos capazes de fazer inúmeras coisas boas e ruins, mas quando não temos limites nos tornamos pessoas altamente destrutivas. Nos tornamos especialistas em escolhas ruins, em fracassos constantes e abusivos por não saber ouvir e lidar com o NÃO.

Se até o próprio Deus nos diz NÃO quando necessário para nos tornar pessoas melhores, para nos dar um novo direcionamento, para nos dar oportunidades melhores, para que a gente tenha uma vida melhor e mais saudável em todos os aspectos, por que dizer SIM a tudo a uma criança (um ser em construção de caráter e personalidade)?

Para facilitar a criação? Isso não é criar ou educar. Isso é destruir a autonomia, a autoestima saudável, o social, o psicológico, o emocional, a ética e moral dessa criança.

Criar e educar é uma tarefa difícil, constante, que requer paciência, amor, dedicação e conhecimento. Dizer um “NÃO” a qualquer criança, principalmente a um filho é doloroso, mas é necessário.

O NÃO é um limite que foi estabelecido para proteção e não punição.
Aprenda a dizer isso quando necessário.

ARTHUR

Nome forte. Tão forte e lindo que parece nome de rei ou guerreiro. Eu gosto desse nome e gosto ainda mais de um ser bem especial que carrega esse nome.

O significado do nome Arthur tem origem celta e quer dizer “generoso” ou “nobre”. Esse meu pequeno, grande Arthur é assim.

Ele é dono do sorriso, da alegria e energia mais contagiante que já vi numa pessoa. Ele é carinhoso, generoso, inteligente, esperto que só e muito, mais muito lindo.

Ele tem 10 anos, e faz parte do grupo de pessoas com TEA (Transtorno do espectro autista). Sim, ele é autista e ainda não é totalmente verbal. Fala poucas palavras e só quando quer ou quando a gente insiste muito. Eu amo ver ele chegando na escola. Amo ver os pequenos passos rumo ao desenvolvimento dele. Cada detalhe nele me impressiona. Fico admirada!

Apesar dele ainda não falar tanto quanto a gente gostaria, ele entende tudo o que a gente fala com ele. Ele é super atento até ao tom de voz. Percebe nosso carinho, nossa chamada de atenção quando precisa e até mesmo quando a gente está triste.

Outro dia estava brincando com ele no pátio e eu fingi chorar para ver sua reação e pra minha surpresa ele fez uma carinha de preocupado e foi logo me acariciando como quem diz: “Calma, vai passar” ou “vai dar tudo certo, eu tô aqui”. Achei fantástico! Não sabia se ria ou chorava mesmo de tanta alegria.

Pra nós, educadores, nossa maior alegria é ver o desenvolvimento das crianças, dos alunos que estão conosco. E ver crianças e/ou adolescentes que tem alguma deficiência (física, intelectual ou múltipla) ou condição neurológica no caso do TEA (autismo) se superando cada dia mais é motivo de comemoração, de alegria e de muita gratidão a Deus por cada passo que eles dão. Isso deixa meu coração tão feliz que eu chego a me emocionar de verdade com as atitudes e as conquistas deles ainda que sejam pequenas, mas não deixam de ser conquistas.

Quem vê de longe pode até pensar que eu acolho o Arthur. Que sou eu quem ensina. Mas a verdade é que é ele quem me acolhe todos os dias, pois se ele não quisesse a minha presença, eu não conseguiria chegar nem perto, pois ele mesmo já me recusaria. Ele é quem me ensina. Me ensina a ser uma pessoa melhor. Me ensina a ter mais paciência. Me ensina a ser mais alegre. Me mostra que é possível ser feliz com tão pouco.

Ele me mostra cada dia o valor da vida, do carinho, do afeto, da compreensão, do conhecimento e do amor incondicional.

Arthur. Tutu. É o nome da minha dose diária de alegria. Não dá pra ficar triste, deprimido(a) por muito tempo do lado dele.

Meu pequeno e grande Arthur (Tutu) que Deus conserve esse seu sorriso, alegria e energia contagiante sempre e que faça de você ainda mais forte, mais generoso, carinhoso e que te dê tudo que for preciso pra você brilhar nessa incrível jornada da vida! ❤

INSENSATEZ

Essa semana eu estava mais sensível que o normal. Havia muitas coisas me incomodando dentro de mim e minha própria insegurança era uma delas. Não o bastante, ainda dei lugar para o meu vitimismo, pois eu queria que massageassem meu ego para eu me sentir melhor.

Eu já estava sensível e fiquei ainda mais por não ter sido sábia e agido com mais inteligência. Essa semana passamos por uma reunião em que foi falado e explicado nossas funções e a quem devemos recorrer em casos extremos. Eu estava lá. Eu ouvi tudo e ainda levantei uma queixa particular sobre as pedagogas.

Poucos dias depois dessa reunião eu levei um assunto do aluno para a vice diretora e quando eu perguntei se eu tinha que relatar isso para a pedagoga, ela simplesmente disse: “Não foi isso que foi dito na reunião?”. Ela não estava brava. Não foi sarcástica. Mas foi seca em suas palavras e o tom era de “você está me perguntando o óbvio”.

No mesmo dia eu notei que alguns colegas de trabalho estavam indiferentes comigo. Não me olhavam nos olhos mais. Nem mesmo quando eu falava algo direcionado a elas.

Fiquei mal a semana inteira. Pensando em como eu sou substituível tanto como profissional quanto como pessoa. Eu fui deixada de lado. As pessoas nos deixam de lado quando não somos mais interessantes para elas. É fácil ser indiferente.

Hoje eu acabei descontando toda essa frustração acumulada em quem não tinha nada a ver com meus problemas. Resultado? Me senti mal e chorei. Não tive como me desculpar com a pessoa, mas percebi que preciso trabalhar melhor minhas emoções, meus problemas ao final de cada dia. Não posso deixar que todo esse lixo emocional se acumule e contamine a minha alma.

Preciso assumir minhas responsabilidades e abandonar de vez esse vitimismo. Trabalhar essa minha insegurança, essa autoestima fragilizada para melhorar quem eu sou ao invés de querer que massageiem meu ego. Não é disso que preciso.

Está tudo bem se não gostarem de mim. Está tudo bem se eu não for interessante aos olhos dos outros. Não é o fim do mundo se não olham pra mim quando eu falo. Não tenho que ficar pra baixo quando chamam a minha atenção. Minha missão não é agradar os outros, mas sim melhorar quem eu sou.

“A mulher sábia edifica a sua casa, mas a insensata com suas próprias mãos a derruba.” (Provérbios 14.1)

É tempo de deixar de ser essa mulher insensata e tomar uma nova postura, uma nova atitude. Me tornar uma mulher sábia. Pensar e agir com sabedoria e inteligência. É assim que vou me tornar uma pessoa bem resolvida na vida.

PAPEL DE BOBO

Existem diversos tipos de linguagem. A imagem é uma delas e muitas vezes fala mais do que as palavras. A imagem a seguir retrata o típico cotidiano de uma sala de aula nos dias de hoje.

Alunos brincando, jogando bolinhas de papel, subindo nas carteiras, destruindo patrimônio público, ridicularizando seus professores são alguns dos comportamentos “normais” de um aluno.

Os pais? Deus me livre! Nós temos medo deles, pois alguns conseguem ser piores que os filhos (os melhores alunos, se é que você entende). Eles chegam afrontosos, carregando em suas línguas palavras ofensivas. Não querem nos ouvir. E como vão ouvir se os filhos são outros dentro de casa? Como vão ouvir nosso lado da história se nos roubaram o respeito, a autoridade em sala de aula, o nosso papel de educar? Nos roubaram o tal do respeito.

Agora estamos ali só fazendo papel de bobos mesmo. A escola virou um circo e nós somos os palhaços. Os alunos fazem o que bem querem, os pais apoiam e nós ficamos sem ter o que fazer, ficamos sem lugar.

Chamar atenção, deixar de castigo, corrigir o aluno, é coisa de professor corajoso, pois quem vê de fora e não sabe a história diz ser justo um processo. Mas esperar o quê de um país onde a educação é só saber ler, escrever e contar? Esperar o quê de um país que avançou em liberdade, em tecnologia, em ciência, mas regrediu no principal que é a educação?

Eles zombam, agridem (física e emocionalmente), fazem o que querem e quando querem e ai de nós, professores, se levantarmos a voz. Aos olhos de muitos, nós não fazemos nada. Aos olhos de outros, nós não significamos nada. E assim caminha a humanidade, uma geração cada vez pior que a outra.

Tenho o direito de ficar indignada ou será que só tenho o direito de ficar calada?

Imagem retirada do site soescola.com

NÃO VAI DAR NADA PRA MIM. E SE DER É POUCA COISA

Uma frase dita num tom de brincadeira “Vai dar nada pra mim, não. E se der é pouca coisa”; mas revela uma geração livre de tudo, inclusive de punição, ou melhor, das consequências de seus atos absurdos e desrespeitosos.

Eu que trabalho numa escola pública já vi muito dos alunos levar a bandeira e até debocharem e esfregarem na nossa cara o tal do “não vai dar nada pra mim”. Sabe o que é pior e mais assusta? É que geralmente eles estão certos.

As gerações estão cada vez piores. Essa é a geração mais livre, com acesso a tudo na palma da mão, entretanto, é a geração mais nociva, agressiva, doente e sem senso comum ou noção das coisas à sua volta.

São quase intocáveis. E como sabem disso tiram proveito. Ai de nós, educadores, se porventura ousarmos tocá-los, enfrentá-los ou corrigi-los como antes era possível. Eles podem. E podem tudo. Nós não.

Eles podem nos ofender, machucar, gritar e dizer não. Mas ai de nós se revidarmos! E essa geração tem um agravante… O apoio dos pais. E não estou me referindo aquele apoio emocional, educacional, não. Os pais de hoje em dia (não todos, é claro!) apoiam esses atos “inocentes” de seus filhos. Afinal, nós estamos na era da liberdade!

E assim caminha a humanidade… Rumo ao caos. É sobre isso e tá tudo bem. As pessoas estão confundindo liberdade de expressão com falta de respeito e amor ao próximo. Os valores e bons costumes são coisas ultrapassadas. Agora tudo pode. Limite? Só se for para o cartão de crédito, né bem? Porque as crianças de hoje nem sabem o que é isso e os pais reforçam essa ideia de indisciplina.

Criança de 5 e 6 anos manda e desmanda no professor. Adolescentes nos mandam tomar naquele lugar e tem pai e mãe achando lindo isso. “Meu filho(a) tem personalidade forte”, ele/ela tem opinião própria. Que nada! Seu filho ou filha é sem educação mesmo. Não sabe ouvir um NÃO. E você tem culpa nisso.

Os filhos refletem o que vivem em casa. A ideia inicial era criar uma geração pensante, crítica, consciente, humanizada, não uma geração destrutiva. Essa é a geração mais livre, mas também é a geração mais transtornada e abusiva.

Como você acha que vai ser as próximas gerações se não houver uma intervenção adequada nessa?

“Se a educação sozinha não transforma a sociedade, sem ela tampouco a sociedade muda.” Paulo Freire

“Educai as crianças para que não seja necessário punir os adultos.” Pitágoras

“E, na verdade, toda a correção, ao presente, não parece ser de gozo, senão de tristeza, mas depois produz um fruto pacífico de justiça nos exercitados por ela.” Hebreus 12:11

ME DESCULPE E MUITO OBRIGADA PELO TEMPO QUE PASSAMOS JUNTOS

Se despedir de algo ou alguém é doloroso. Ainda mais quando se está acostumado, já conhece bem e se sente confortável. É doloroso quando se está tão apegado a algo ou alguém, mas o partir breve ou permanente faz parte da jornada da vida e de suas muitas fases. Um ciclo se encerra e outro começa.

Eu tive que me despedir deles. Autistas precisam de rotina. Precisam de alguém estável e confiável. E no momento eu não sou a melhor opção para ser o apoio que eles precisam. Infelizmente. Não estou na minha melhor forma.

Quando ela me chamou pra remanejar a troca de alunos, eu confesso que tive vontade de chorar e bater o pé. Vontade de implorar por uma segunda chance. Mas não valia a pena fazer nada além de concordar, afinal, não é a minha vontade que importa. São as necessidades deles que vêm em primeiro lugar.

Apesar de achar que ela não gosta nenhum pouco de mim, eu reconheço que é uma pessoa justa. A troca não foi uma punição. Ela foi gentil comigo, entendeu minha atual condição e remanejou tudo de acordo com o que sou capaz no momento. Mas não posso dizer que não doeu. Não posso dizer que não estou sentida.

Ele chorou por eu não poder mais estar com ele e eu chorei também (longe dele). O outro apesar de ser mais velho e maduro ficou um tanto quanto confuso, mas também aceitou sem desespero. Apesar deles não entenderem bem o porquê, aceitaram o novo arranjo. Não fizeram birra, não rejeitaram as novas atendentes. E eu fiquei orgulhosa de ver como estão crescidos.

Ela me perguntou se estava tudo bem, e eu, por um instante pensei em implorar, em dizer que não, mas dei lugar a razão ao invés da emoção. E concordei. Disse tudo bem apesar de no fundo não querer que fosse assim.

Meninos, eu peço desculpas por atualmente não ser o apoio estável, confiável e necessário que tanto precisam. A troca foi necessária e vocês vão se desenvolver muito mais. Logo eu serei apenas uma mera lembrança e está tudo bem.

Sou profundamente grata pelo tempo que passamos juntos. Eu aprendi muito com cada um de vocês. Vocês conseguiram conquistar meu coração e iluminaram meus dias. Aprendi a ser mais paciente, mais gentil, mais humana e a me colocar mais no lugar do outro.

Agora é hora de se adaptar de novo. Fazer novas conexões.  É hora de iniciar um novo ciclo. Vocês podem não entender, mas às vezes a gente perde pra ganhar. A gente vai continuar se vendo em alguns momentos e embora eu os veja crescendo de longe vou me orgulhar sempre de vocês. Acreditem, vocês vão se desenvolver mais, muito mais!

Não sou útil pra vocês agora, mas quem sabe na próxima vez estarei saudável de novo, estarei inteira de novo e possa voltar. Me perdoem por quebrar a minha promessa de ficar com vocês até o final e muito obrigada por permanecerem comigo durante todo esse tempo.

Eu amo vocês. ❤

CRIANÇAS PRECISAM DE ATENÇÃO E CARINHO

Ele é um garoto autista de 9 anos com uma inteligência excepcional. Um tanto quanto rabugento, eu confesso. E ele mesmo reconhece. Mas ontem ele me surpreendeu não pela qualidade do seu vocabulário que é fantástica, nem pelo seu dia de “bom humor”, mas por sua aproximação.

Ele raramente interage, pois o social dele não é tão desenvolvido como a gente gostaria que fosse. O que ele mais gosta é assistir os vídeos do “O rei leão”. Ontem após o recreio ele pediu pra assistir e eu deixei.

Desci com ele e o outro aluno que fico para o pátio da escola pra que ele pudesse ver os vídeos. Sentamos na arquibancada e ele foi se aproximando de mim e falando sobre o rei leão. Me perguntou quais as cenas que eu mais gostava ou qual versão do filme eu preferia. Percebi que ele se sentou tão perto de mim que era como se quisesse colo.

Eu estou acostumada com o contato físico do meu aluno que também é autista, porém com o lado social mais desenvolvido. Ele gosta de abraçar, sentar perto e até senta no meu colo vez ou outra. Já o outro é “de poucos amigos”, sabe?

Foi quando ele me surpreendeu. Ele pôs o meu braço em volta do seu pescoço e se recostou em mim como uma criança pequena faz quando quer colo e quer se sentir segura. Assim ele ficou. Ficou bem à vontade e feliz assistindo seu vídeo favorito.

Conversamos muito. Tinha outro aluno que estava no pátio e não queria ficar em sala. E eu disse que aquele aluno estava muito teimoso, desobediente e que não era legal o que estava fazendo. Ele reconheceu e disse que também tinha dias que ele ficava assim, mas que hoje ele não estava nervoso.

Só então percebi algo que não tinha me dado conta devido ao seu “mal humor” de quase todos os dias. Ele também quer e precisa de atenção e carinho. Ele sabe como eu ajo com o aluno que eu fico e está sempre observando. Ele também tem sentimentos, emoções e laços que deseja fazer. Por debaixo de todo aquele mal humor, por trás daquela cara de bravo e jeito meio grosseiro de falar, ele quer se conectar, quer fazer parte, quer se sentir amado e protegido.

Para a minha surpresa ele me abraçou e sorriu mais vezes do que já pude ver. Ele permitiu que eu interagisse com ele. E até interagiu com os dois alunos que estavam no pátio com a gente. Ele e o outro aluno passaram 30 minutos deitados no meu colo, agarrados a mim como se eu fosse a pessoa mais importante, confiável e segura pra eles.

Foi quando percebi que preciso ser mais paciente. Que preciso enxergar além das camadas externas (das aparências). Que por trás de toda pessoa existe uma história. E que todos querem se conectar, se expressar, se sentir amado, seguro. Todos querem proteção, amor, segurança e afeto. As crianças não são diferentes. Elas também querem atenção e carinho. Somos nós, os adultos que precisamos enxergar isso e trabalhar em nós a paciência, e novas formas de se comunicar.

Aquele abraço, aquele aconchego foi importante pra ele, mas foi ainda mais especial pra mim. Sua aproximação me deu uma importante lição sobre a função de educadora. Me trouxe um novo olhar, uma perspectiva diferente sobre paciência, referência e educação.

Aquele abraço expressou mais do que carinho, conforto ou apoio. Significou um “ei, eu também sou gente, tenho sentimentos e quero expressar da forma que sou”.

Posso confessar uma coisa? Foi a melhor coisa que me aconteceu. ❤

Foto: RODNAE Productions

A ÚLTIMA A SER ESCOLHIDA

Alguns dos alunos onde trabalho me fazem lembrar da minha época de escola. Me fazem lembrar de mim mesma naquele tempo.

Eu sempre fui aquela aluna mediana, introvertida e que não revelava minhas verdadeiras habilidades. Sabe do que eu mais lembro? De ser a última a ser escolhida. De ser sempre aquela que a professora tinha que encaixar em algum grupo.

Eu odiava trabalhos em grupo. Os colegas que tinham que me aturar no grupo faziam cara de desgosto, “ah, ela não”! Desde a primeira série até o último ano do ensino médio foi assim. Ninguém gostava de mim e eu não gostava deles, mas tinha que me socializar. Eu estava na escola pra aprender não apenas os conteúdos, mas também pra conviver em sociedade.

No ensino fundamental eu era muito boa em jogar queimada. Era uma das poucas atividades em educação física que eu gostava. Era uma das últimas a sair do jogo, mas era a última a ser escolhida pelos colegas (a que restava) e como isso me frustrava. Eu pensava: Eu sou boa nesse jogo, mas por quê não me escolhem logo?

Por vezes me diminui achando que eu era o problema. Achando que não era capaz ou não era boa o suficiente. No fundo eu queria ser reconhecida. Mas tudo que consegui era ser a última a ser escolhida. Eu tinha amigos sim, mas mesmo eles não viam muita coisa em mim, eu entendo. Afinal, eu não revelava o quão inteligente eu era, nem boa em algo.

Já no ensino médio foi pior. Adolescentes, sabe?! Alguns se destacavam pela beleza, outros pela inteligência, outros nos esportes… E eu não destacava em nada. Se não respondesse presente na chamada nem mesmo os professores saberiam que eu estava lá. Eu não me importava em ser “invisível”. O que me frustrava era fazer parte de algo e ninguém perceber minhas habilidades. Como assim eles não veem que sou boa com as palavras escritas? Como assim não percebem que sou melhor nessa matéria do que na outra? São tão ignorantes assim ou só querem me deixar de lado?

Lembro que uma vez o professor de inglês deu uma prova em dupla e ele me colocou com um aluno muito metido. Nitidamente ele estava chateado por não fazer par com uma de suas amigas. A panela perdeu a tampa. Sabe o que me irritou? Não foi o fato de sentar com ele. Eu realmente não me importava com quem o professor me colocava. Foi ele supor que eu não sabia nada da matéria, não me deixar fazer nada e ainda colar na prova porque as amigas estavam sentadas atrás de nós. Resultado? O pior. Tiramos uma nota baixa e ele riu e disse: “Eu nem precisava de ponto mesmo, já passei”.

Tive vontade de puxar ele pelos cabelos. Eu precisava de pontos. Sabia a matéria melhor do que eles. E acharam que por estar sempre tirando notas altas eram melhores do que eu? Ah, me poupe! Ainda bem que esse tempo já foi. Eu era boba demais. Não tinha uma autoestima saudável, tinha dificuldade em dizer o que realmente sentia ou pensava. Deixava minha própria vida à deriva.

Hoje quando vejo os alunos na escola onde trabalho eu até acho graça. Quando os vejo frustrados digo que vai ficar tudo bem e que numa próxima vez eles se sairão melhor. Faço o melhor que posso pra que a autoestima deles não seja prejudicada. Brinco, cuido, ensino, corrijo, e falo sobre suas habilidades. Não quero vê-los se diminuindo, nem se autodestruindo como muitas vezes eu fiz.

Quero que eles sejam felizes. Quero que olhem pra si mesmos e veja o quão inteligentes e capazes eles são. Porque eles são.

Quando digo que vai ficar tudo bem e que numa próxima vez eles se sairão melhor, não estou mentindo, nem reconfortando. Estou dizendo a verdade por experiência própria. E estou dizendo pra mim mesma. Cada dia a gente pode melhorar um pouquinho. Não se preocupe, vai ficar tudo bem, acredite! 😉

Foto: Pixabay/pexels