VERDADES ESPELHADAS

O que mais te incomoda no outro, geralmente é um reflexo de si mesmo. Parece absurdo, né? Mas é uma verdade espelhada.

Quanto mais a gente julga o outro mais somos parecidos com o outro.

As pedras que lançamos no telhado do vizinho um dia caem sobre nosso telhado porque na verdade estamos todos sob o mesmo teto.

Sua vizinha te vigia pela janela, ouve atrás da porta pra ter o que fofocar? Pois é, mas será que eu e você já não fizemos o mesmo?

O governo é corrupto? Pois é, mas será que é só governo? Quantas vezes eu e você também não fomos corruptos? Viemos de uma história, de uma cultura marcada pela corrupção. E isso leva tempo pra ser mudado.

Fulano é mentiroso? Hum… Entendo. A mentira é algo intolerável, né? Pois é, mas será mesmo que eu e você dizemos sempre a verdade? Não mentimos nunca? Nem uma vez sequer? Uma “mentirinha branca” pra nos proteger, pra não ferir ou qualquer outra desculpa que a gente acha necessária?

Ah! Aquela pessoa realmente te incomoda, né? Até a respiração dela te irrita… A verdade é mais simples e óbvia do que se possa imaginar, mas somos nós que fingimos de cegos. O que mais nos incomoda no outro é apenas um reflexo de nós mesmos e isso nos inquieta, nos envergonha e nos deixa em déficit com a vida.

É fácil apontar o dedo para o outro, culpar o outro, criticar o outro.

Difícil é se olhar no espelho e encarar as verdades que a gente insiste em ignorar.

O outro é tão humano quanto eu e você.

Eu e você somos tão sujeitos a quedas, tão vulneráveis e suscetíveis ao mal quanto o outro é.

Vivemos num mundo que está sempre lançando críticas, está em constantes debates filosóficos na busca por uma “sociedade melhor e racional”. Querem erguer a bandeira da “liberdade, igualdade e fraternidade” massacrando o próprio povo.

Querem um mundo melhor, racional, mais humano, mas continuam a zombar, discriminar, exilar os que pensam e vivem de maneira diferente. Isso é desrespeito.

Eu costumava a desejar a morte dos outros. Por exemplo, para os criminosos. Aqueles casos odiosos que a gente vê nos jornais. Então, me via sendo a favor da pena de morte. Até que um dia eu pensei: Apesar de tudo essa pessoa é filho(a) de alguém. Essa pessoa pode não ser importante pra mim, mas é importante pra alguém. Eu não tenho domínio sobre o futuro. “Bandido bom é bandido morto”, mas o bandido de amanhã pode ser meu filho, eu vou ficar feliz com a morte dele apesar de tudo?

Foi aí que as escamas caíram dos meus olhos e eu pude entender que todo e qualquer ser humano é falho. Que realmente a “ocasião é que faz o ladrão”. Somos humanos e é exatamente por isso que somos sim capazes de qualquer coisa. Dos atos mais simples e bons aos mais violentos e cruéis. Do bem e do mal. Tudo depende da situação. Realmente é “a ocasião que faz o ladrão”.

Você acha que é uma pessoa de bem por não ter preconceito com isso ou aquilo, mas vasculhe direito e verá que tem sim preconceitos por outras coisas.

Você acha que é uma pessoa de bem porque não rouba? Mas vasculhe direito sua alma, sua vida e verá que já roubou. Ainda que inocentemente.

Você acha que é uma pessoa de bem porque não é capaz de matar? Você é capaz de matar e sob a circunstância certa muito provavelmente vai matar, ainda que seja em legítima defesa.

Ninguém é 100% mal. Assim como ninguém é 100% bom. Em nós há bondade e maldade. O grau é que é diferente. Assim como o teor alcoólico de uma bebida é de acordo com a quantidade ou porcentagem de etanol nela contida, assim é o grau de bondade ou maldade em nós. Depende da quantidade que colocamos.

O pior que vemos no outro é apenas um reflexo de nós mesmos.

Não é só outro que tem que ser exposto em praça pública, nós também precisamos ser.

Examine cada um a si mesmo e veja suas próprias verdades, suas fragilidades, as áreas vulneráveis, as falhas, os erros de conduta, a própria maldade, a bondade, a luz, as verdades e as mentiras que há dentro de si.

Exponha cada um a si mesmo. Deixe sua alma despida e enxergue seu verdadeiro eu.

Quando a gente fizer esse tipo de análise (autoanálise) estaremos prontos para construir esse mundo melhor, mais digno, racional, e mais humano dentro de cada um e então, transparecer para o exterior.

Porque a verdadeira mudança acontece sempre de dentro para fora e não ao contrário.

Foto: Jenna Hamra/pexels