BONECA DE RETALHO

Um dia estava assistindo um episódio do desenho Três Espiãs Demais, onde uma das meninas foi selecionada como modelo por uma mulher que dizia ser de uma agência confiável, mas no final se tratava de uma tentativa de criar a modelo perfeita.

No episódio mostrava uma mulher costurada com várias partes de outras pessoas que a dona da agência considerava perfeitas. Uma boneca de retalho era o que parecia. Partes de corpos que não lhe pertenciam sob a ideologia da perfeição.

E quantos de nós já não desejamos ser como essa boneca? Quantas pessoas já não morreram numa maca na tentativa de ser quem não se é? Retalhos de um ser humano em busca de um padrão de perfeição insaciável, insatisfeito e inatingível.

Tira isso daqui e coloca ali. Quebra ossos e refaz o rosto. Aplica botox, silicone, arrisca a vida pela imagem distorcida, algo que não é real. Se quebra, se refaz… Pelo assédio, por aplausos, holofotes, por reconhecimento de uma beleza externa, pela inveja, pela falta de autoestima. Se quebra e se refaz pelo outro, para o outro.

E a vida fica vazia. Fica por um fio. Eu tenho que ser perfeito(a). A alma perde o próprio brilho, mas quem se importa? Afinal, é de máscaras que a gente vive, não é mesmo? Pra que se preocupar com a alma se não é ela que aparece diante dos outros? O reflexo vai ficando irreconhecível. E a dor só aumenta, pois nada disso preenche o vazio que se sente.

Uma boneca de retalho. Marcada pelas injeções, pelas linhas de sutura, pelas próprias frustrações. O corpo marcado, a alma vazia, os olhos sem brilho, a vida sem alegria. A cara esticada e o sorriso forçado. Peito e bunda empinados e alma em frangalhos. Barriga chapada, corpo desenhado e o coração dilacerado. Uma “Emília” sem alegria.

Não estou dizendo que é errado ou que sou contra cirurgias plásticas. Estou criticando os excessos, pois são esses que roubam a autoestima, a felicidade e sugam a alma para dentro de um buraco negro. Tornando um ser humano saudável num monstro costurado. Um monstro insaciável por um padrão de beleza photoshopado, plastificado, inventado nas revistas, nos outdoors, na tv, onde nem tudo que se vê é real e muito menos natural.

Caro(a) leitor(a), você tem sua própria beleza e é único(a) no mundo! Não há ninguém igual a você. Sei que é difícil amar a si mesmo, eu mesma ainda estou aprendendo, mas acredite, se você não se amar, os outros vão ditar as regras, impor padrões e dizer que você tem que ser o que eles querem que você seja. Isso é viver sob o domínio da escravidão. Você quer ser escravo(a) ou livre? Você quer ser você mesmo ou ser qualquer um ou só mais um?

Não se iluda. As migalhas que você aceita hoje te transformarão num monstro amanhã. Um monstro faminto por clicks, likes, um reconhecimento que te deixará cada dia mais irreconhecível diante do espelho. É um fardo pesado demais pra suportar, você não acha?

Se um dia você tiver e quiser a oportunidade de fazer uma cirurgia plástica, faça! Mas faça de forma consciente, de acordo com seu próprio padrão e com um médico qualificado. Não arrisque sua vida inconsequentemente. Não queria correr riscos desnecessários.

Queira ser a sua melhor versão e não a versão inalcançável dos outros. Seja você mesmo(a) e não apenas mais um!

Sua vida tem um valor imensurável. Não aceite migalhas, nem se deixe transformar num monstro! As aparências podem enganar. Então, não permita que elas enganem você!

Não se deixe seduzir pela linda forma de uma boneca de retalho. Elas não são elas. Não são inteiras de si mesmas. São apenas partes daqui e dali.

Lembre-se: São os extremos que matam, então, aprenda a viver uma vida equilibrada. Nem mais, nem menos. Encontre o seu equilíbrio e aprenda a se reconhecer diante do espelho, assim nunca verá uma imagem distorcida de si mesmo(a).

Cuide do seu corpo físico, da sua mente, do seu espírito e das suas emoções! Sua vida tem um valor imensurável. ❤

Foto: Wilson Vitorino

TRABALHO DESVALORIZADO

A gente valoriza os bens, mas não o trabalho. Como pode isso? Simples. Uma mera questão cultural. Nossos antepassados venderam o trabalho, a mão de obra por espelhos, por qualquer objeto velho e que chamasse atenção. Naquela época eles não sabiam, então era compreensível. A ignorância é perdoável. A ignorância é a falta de conhecimento e isso de certa forma é aceitável e fácil de ser corrigida. Mas e hoje em dia? Qual o nome que você dá quando vende seu próprio trabalho, sua mão de obra por migalhas? Eu chamo de negligência porque hoje a gente conhece a verdade, sabe o quanto nos custou os materiais de trabalho, o tempo gasto em aperfeiçoamento, tudo em relação ao trabalho, mas a gente troca tudo isso pra satisfazer um cliente ou um chefe que não nos valoriza.

Eu não tenho nada contra descontos, eu mesma adoro porque é uma forma de economizar pro futuro. Eu sou contra ao abuso. Aquela pessoa que quer um determinado produto ou serviço de graça. Essa é a pessoa que nunca vai valorizar o seu trabalho. Você vai sempre trabalhar de graça pra ela e no final do dia ela vai estar plena e você frustrado.

A culpa é nossa. Afinal de contas, é a gente que está sempre cedendo, sempre dizendo sim e voltando ao engano dos índios, desvalorizando nosso próprio trabalho. Dessa vez estamos dando motivos pra nos escravizarem…de novo. Antes, eles eram pegos no laço e forçados a trabalhar por pouca coisa. Eles não viviam, apenas sobreviviam. Hoje somos pegos na lábia. Trabalhamos por pouco e ainda dizemos com um sorriso no rosto: “Obrigado e volte sempre!”.
Os índios não tinham conhecimento de valor, de remuneração, de mercado de trabalho, portanto não tinham como se resguardar, negociar de igual pra igual e por isso foram enganados, subjugados. Neles não há culpa. Mas e quanto a nós? Até quando vamos abaixar a cabeça pra satisfazer alguém que não valoriza o nosso trabalho? Até quando vamos trabalhar por migalhas por medo de inovar ou de dizer não? Até quando vamos servir de saco de pancada pra cliente ou chefe abusivo? Até quando a gente mesmo vai desvalorizar tudo que a gente faz?
Eu estou escrevendo isso lembrando de todas as vezes que fui desvalorizada no trabalho boa parte por falta de dizer NÃO. Por medo de ser demitida, por medo de um cliente em potencial não fidelizar porque eu não dei o desconto de 100% que na cabeça dessa pessoa era justo. Pelo fato da pessoa ser “da família” e achar que justo é eu tirar do meu bolso pra bancar o luxo dela enquanto ela desmerece o que faço.
Os bens materiais são importantes eu concordo, mas o seu trabalho também é. Se você não quer se sentir um fracasso eu recomendo que você peça a Deus muita sabedoria pra responder a cada um como se deve (sem excessos nem faltas), que você se aperfeiçoe no trabalho (faça cursos, participe de workshops, vá a palestras) invista em conhecimento, e saiba dizer NÃO quando é preciso. Valorize o seu trabalho e os dos outros também.

E se você for o tipo de pessoa que quer tudo de graça vá até as pessoas que trabalham de graça (elas existem), mas não reclame dos resultados.

Valorize, respeite porque a pessoa trabalha por amor, mas ela também paga contas, alimenta a família, gosta de sair com os amigos, faz compras, repõe estoque, tem planos pro futuro, ou seja, assim como você precisa de dinheiro ela também precisa.

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Foto: pixabay